segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Também quero meu final feliz.

    Semana passada me perguntaram por que eu me denomino sapatão e não lésbica, eu respondi rápido que achava que sapatão era mais impactante do que lésbica e que me sentia mais sapatão do que lésbica mesmo. Fiquei com esse questionamento depois por um tempo pensando quando eu comecei a me denominar sapatão e quando eu larguei o lésbica. A verdade é que eu nunca me senti empoderada com a palavra lésbica e acho que por pouquíssimo tempo usei pra falar da minha sexualidade.

    Antes de conseguir assumir que eu gostava de mulheres eu me assumia como bissexual. Isso tem um peso muito grande na minha vivência, por muitos anos eu me forcei a ter relacionamentos com homens cisgêneros por achar que mulheres lésbicas não poderiam ter finais felizes. Eu cheguei a essa conclusão por todos os seriados e filmes lésbicos que eu assisti em que, no final, sempre acontecia alguma coisa que uma das mulheres morria, ou então elas se separavam e seguiam caminhos diferentes - isso quando uma delas não acabava se relacionando com um homem cis por descobrir que “foi só uma fase” (sic). 


      
    Eu criei repulsa pela minha sexualidade porque eu não queria ser uma mulher sozinha, triste ou sem família. Eu queria uma história bonita com um final feliz, mas só tem final feliz quem é hétero, monogâmico e constitui uma família nos moldes tradicionais. Eu me forcei a ser bissexual porque eu acreditava que em algum momento um homem ia me proporcionar o final feliz que eu tanto via nos filmes héteros. E com isso foram anos que eu me condenei por ser sapatão, por gostar de mulheres e não sentir prazer com homens. Quanto mais me vendiam a ideia de que apenas certos casais encontravam a felicidade, mais eu vendia minha sexualidade por casos baratos e abusivos.

    A minha maior dificuldade foi conseguir aceitar que eu poderia ficar sozinha um dia e que isso não é um problema. Aceitar minha própria companhia é muito difícil, até hoje pra mim é um exercício diário conviver comigo, com a minha personalidade, minha sexualidade. Hoje eu vejo como Hollywood e toda essa estrutura midiática heteronormativa é cruel com pessoas não-hétero, porque só nos traz um sentimento de culpa e autodepreciação, nos forçando a fingir que somos hétero e que assim um dia essa sensação de deslocamento vai sumir. 

    É muito difícil conseguir se aceitar e entender que sua sexualidade não tem nada de errado quando nos bombardeiam com filmes, músicas, programas onde nós não temos espaço (e quando temos, não somos nós que delimitamos e resolvemos como nós vamos acabar). Mas o empoderamento, apesar de difícil, é libertador. Eu nunca me senti tão bem comigo mesma desde quando consegui me chamar de sapatão pela primeira vez e não tive vergonha, medo ou repulsa. 

    Descobri que ser sapatão não tem nada de errado e meu final feliz pode ser sozinha ou pode ser acompanhada de uma ou mais pessoas. Foi essencial aprender que não preciso forçar meus relacionamentos e que se eu fizer isso eles vão acabar de uma forma ruim para as duas pessoas. Eu preciso cuidar deles, não pensando em casar ou viver feliz para sempre, mas porque eu tenho que aproveitar os momentos, as felicidades e delicadezas do agora. Se um dia acabar, tudo bem também, afinal eu não posso ser dependente de outra pessoa pra ser feliz. Eu posso ser feliz sozinha. 


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